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A gigante Nestlé se rende à Terceira Onda do Café

Por Ronaldo Muinhos, Diretor e especialista em café do Buenavista Café.

Blue Bottle Coffee

Em 2002, James Freeman, de Humboldt County, California, desistiu de ser um clarinetista profissional e começou a perseguir sua outra paixão, torra de café.

James Freeman, fundador da Blue Bottle Coffee.
James Freeman, fundador da Blue Bottle Coffee.

Freeman começou em um galpão de 183 metros quadrados em Oakland, Califórnia, e nomeou seu negócio recém-nascido de Blue Bottle Coffee. Quinze anos depois, a Blue Bottle cresceu para além de uma empresa de uma só pessoa para uma das fornecedoras de cafés especiais mais conhecidas do mundo e uma das precursoras da chamada Terceira Onda do Café.

Mas seu negócio agora possui um novo e enorme sócio. A gigante suíça do setor de alimentação acaba de anunciar a compra majoritária de 68% da empresa de Freeman, por U$ 425 milhões.

É um dos sinais mais evidentes de que a terceira Onda do Café se tornou um modelo de negócio promissor e com grandes perspectivas de crescimento.

A Terceira Onda do Café

O termo surgiu em meados do ano 2000, mas teve sua popularização nos últimos anos. É um movimento forte nos Estados Unidos e Europa e que aos poucos ganha força por aqui.

Alinhada à exigência crescente dos consumidores por qualidade, o movimento valoriza o café como um produto artesanal em vez de uma mercadoria ou commodity. A busca pela qualidade envolve todas as fases de produção, desde o cultivo, passando pela colheita, processamento, torras frescas e principalmente, uma forte relação com os produtores, através de um comércio justo e sem pressões por preços baixos, prática comum da grande indústria.

Leia: A Terceira Onda do Café.

 

Mercado em rápido crescimento

Este novo nicho de mercado vêm apresentando rápido crescimento, nos EUA ele representa de 15% a 20% do café consumido no país, de acordo com a Specialty Coffee Association, SCA. Talvez mais importante que o rápido crescimento do setor, seja o maior valor agregado, o que potencializa as margens de lucro.

Isto despertou o interesse das grandes empresas. A Starbucks, por exemplo, iniciou seu movimento de Terceira Onda através da marca Reserve, com cafés especiais, torras artesanais e lojas com o conceito Slow Food, um dos pilares da Terceira Onda. A Holding JAB, um conglomerado europeu de propriedade familiar, vem montando um império da Terceira Onda com algumas aquisições importantes, entre elas,  as marcas Jacob Douwe Egberts, Peet’s Coffee & Tea e Stumptown Coffee Roasters.

A participação majoritária na Blue Bottle ajudará a Nestlé a expandir seu mercado existente, construído através das já consolidadas marcas Nescafé e Nespresso, para um novo e promissor segmento, baseado em consumidores altamente especializados e exigentes. O investimento também pretende reforçar a presença do conglomerado suíço na América do Norte.

We're chillin' out with our friends at @saltandstraw in Venice, CA today until 5! ?☕️ #LiftedOnTheHighRoad #FirstHitsFree

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Para Blue Bottle, o negócio não apenas agregará novos produtos, ter a Nestlé como proprietário majoritário também a ajudará a reforçar seus planos de expansão, que preveem a abertura de novos mercados na América do Norte e na Ásia, tanto para café torrado quanto para Cold Brew, bebida gelada feita com café, uma das tendências da Terceira Onda.

Embora a Blue Bottle seja um dos players mais importantes da Terceira Onda, ela se distinguiu de seus rivais de maneiras significativas. Ela desprezou as lojas de alto luxo, abdicou das competições de baristas e das longas viagens de Coffee Hunting para encontrar as pequenas e perfeitas fazendas de café, enfatizando a estética e a experiência de uma xícara bem preparada.

Cold brew da Blue Bottle, uma das tendências da Terceira Onda.
Cold brew da Blue Bottle, uma das tendências da Terceira Onda.

A estratégia é um reflexo do fundador da empresa, um músico de fala suave e de formação clássica que começou a torrar café como passatempo, enquanto viaja em turnê com sua orquestra.

Já para a Nestlé, aumentar as vendas de café, particularmente na América do Norte, tem sido uma prioridade nos últimos três anos, um esforço que começou com um grande impulso alcançado pela marca Nespresso.

A Terceira Onda do Café

Acompanhamos, despercebidamente, um movimento crescente no mercado de cafés no país. O surgimento de marcas de cafés, micro torrefações e cafeterias que investem em alta qualidade, não só do insumo, mas também na forma de preparo e filosofia de negócio, principalmente encabeçado por pequenas marcas locais e independentes. É a chamada “Terceira Onda do Café” ou “Third Wave Coffee“.

O termo surgiu em meados do ano 2000, mas teve sua popularização nos últimos anos. É um movimento forte nos Estados Unidos e Europa e que aos poucos ganha força por aqui.

Cafés Especiais x Commodity

Arábica da variedade Acaiá da Fazenda Santa Quitéria, parceira do Buenavista Café.
Arábica da variedade Acaiá da Fazenda Santa Quitéria, parceira do Buenavista Café.

Alinhada à exigência crescente dos consumidores por qualidade, o movimento valoriza o café como um produto artesanal em vez de uma mercadoria ou commodity. A busca pela qualidade envolve todas as fases de produção, desde o cultivo, passando pela colheita, processamento, torras frescas e principalmente, uma forte relação com os produtores, através de um comércio justo e sem pressões por preços baixos, prática comum da grande indústria.

Classificação do café.
Classificação do café.

A popularidade da Terceira Onda ganha força com a crescente procura por grãos de alta qualidade, com destaque para os Especiais, cafés com pontuação acima de 80 pontos na metodologia da Associação Americana de Cafés Especiais (SCAA). São cafés isentos de defeitos, produzidos sob rigorosos controles de qualidade, além de exigências nas áreas social e ambiental, sempre homologadas por certificações internacionais, como a UTZ, Rain Forest, CertificaMinas e Direct Trade.

As Três Ondas

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A Primeira Onda

Atribui-se à Primeira Onda do Café o aumento significativo e proliferação do consumo da bebida em todo o mundo, a partir do final do século XIX e início do século XX. Inicialmente, o consumo de café tinha característica essencialmente utilitária, visando ao estímulo de energia e melhoria de concentração e desempenho decorrentes da ingestão de cafeína. Caracterizava-se pela baixa qualidade dos cafés, essencialmente compostos por grãos conilon (robusta). Com torras de muito escuras, apresentavam sabor amargo e com pouco “corpo” na bebida.

Leia: Café Forte, desconstruindo um mito!
A Segunda Onda

Nesta onda, popularizou-se os conceito de cafés especiais e as diferenciações de origem, ou seja, o reconhecimento de que um café do Brasil é diferente de um da Colômbia, ambos diferentes do café da Guatemala e assim em diante. Também, descobriu-se que variações no processo de torra levariam a bebidas com perfis sensoriais variados e distintos daquele padrão da Primeira Onda.

O café passou, então, a ser apreciado, mesmo não perdendo completamente sua característica de consumo utilitário.

A Segunda Onda foi responsável pela popularização do espresso e sua apresentação para o mundo. Nesta onda, aumentou, consideravelmente, a variedade disponível de bebidas à base de café e de perfis de sabor desta bebida, permitindo a apreciação, também, por um público mais jovem.

A Terceira Onda

O movimento começou como uma reação à massificação e padronização dos cafés na Segunda Onda, torrados quase sempre em excesso, e preparados de modo a alcançar sempre os mesmos perfis de sabor, de forma a manter a consistência de produto, atendendo às expectativas daquele público consumidor.

O distanciamento destas e outras práticas, associadas à Segunda Onda, levou à utilização exclusiva de cafés especiais, com uso quase exclusivo de grãos da espécie arábica, e a uma grande atenção às suas notas aromáticas de sabor, altamente influenciadas pela origem de produção (terroir), métodos de produção e processamento, bem como condições climáticas e outros fatores. Nessa ótica, o café passa a ser encarado como produto complexo e sazonal, passando por um processo de completa “descommoditização”.

Outras formas de diferenciação e agregação de valor ao produto incluem seu preparo artesanal, manualmente, sem pressa, em frente ao cliente e em doses únicas (sob demanda), bem como a utilização de latte art. Desta forma, a bebida torna-se exclusiva e singular, motivo pelo qual é incentivado seu consumo sem aditivos, como açúcar ou chocolate, que mascaram suas notas aromáticas e de sabor, tão desejadas e trabalhadas ao longo de toda a cadeia.

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A visão “Seed to Cup” da Terceira Onda influenciou, também, a busca por torras e métodos de preparo que ressaltassem as características únicas de aroma e sabor obtidas, por meio dos diversos métodos de produção e processamento, trabalhados conjuntamente pelos elos da cadeia desde o início do processo.

Na Terceira Onda, o espresso ainda tem seu espaço, mas é preparado de forma mais manual e menos automática, e cede espaço para os métodos de preparo de café filtrado, os grandes protagonistas desta onda. Dentre estes métodos, que permitem uma maior extração de sabor e destaque das nuances únicas dos cafés, destacam-se o V60, Chemex, Kalita, AeroPress, French Press, Siphon e Cold Brew. Justamente por permitir maior destaque das características distintivas de cada grão, há grande preferência pela utilização de grãos de origem única, ou seja, apenas uma variedade e sem misturas, ou blends.

Many V60s at the photo taken by @morifuji_coffee #hario #v60

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As mudanças não param

Impulsionado pelo desejo de novas experiências, nossa criatividade nos levam à cenários inimagináveis. Não sabemos o que ainda está por vir no mercado de cafés, nem como será a “Quarta Onda”, mas percebemos pequenos movimentos relacionados à tecnologia.

Hoje já podemos encontrar Gadgets controlados por smartphones, que medem todos os parâmetros de uma extração, tempo, quantidades de água, café e proporções. Em breve poderemos ter a inclusão de medidores de sólidos solúveis na bebida além de outras inovações.

Muitos aplicativos para smartphones e tablets auxiliam o consumidor final para o preparo de café em diferentes métodos, utilizando técnicas e protocolos antes restritos aos baristas. O conhecimento está saindo das mãos dos profissionais e chegando até a última ponta da cadeia através da tecnologia.

Internet das Coisas (Internet of Things – IoT)

A Internet das Coisas é uma revolução tecnológica destinada à conectar dispositivos eletro-eletrônicos utilizados no dia-a-dia. Pode ser uma geladeira, seu carro ou porque não, sua máquina de café espresso? A convergência da tecnologia IoT com as máquinas de café espresso por exemplo, já são uma realidade.

Enquanto a próxima onda não vem, podemos apreciar as incríveis experiências da onda atual, repleta de descobertas e sabores incríveis!

[Por: Ronaldo Muinhos, Diretor e especialista em café do Buenavista Café]

Fontes:

  1. Terceira Onda do Café: Base Conceitual e Aplicações (Elisa Reis Guimarães, UFLA, 2016);
  2. Relatório Internacional de Tendências do Café (VOL. 5 / Nº 10 / 30 de novembro de 2016).

Exportações mensais despencam para nível mais baixo de quase cinco anos

Em julho se exportou 22% menos que no ano passado, com queda dos embarques dos quatro maiores produtores devido a fatores diversos. O volume mensal exportado foi o menor desde outubro de 2011, há quase cinco anos. Em agosto os preços caíram 1,5%, mas
o forte desempenho recente dos Robustas continuou, resultando na maior alta de 16 meses.
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O  preço  indicativo  composto  diário  da  OIC  caiu  durante  as  duas  primeiras semanas de agosto, pois no Brasil os Arábicas não pareciam ser afetados pelas geadas da emporada. No final do mês o indicativo diário havia voltado a mais ou menos seu nível inicial, em reação a preocupações com o desenvolvimento da safra brasileira de 2017/18.  De modo geral, os preços pouco se alteraram, fechando o mês com uma média de 131 centavos de dólar dos EUA por libra-peso, 1,5% abaixo da média de julho.
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A evolução dos preços do Robusta exibiu relativa estabilidade ao longo do mês, com um aumento da média mensal pelo sexto mês consecutivo. Os preços indicativos dos três grupos de Arábica caíram em relação a julho, refletindo as perspectivas da oferta de cada um.
A arbitragem assim diminuiu um pouco, mas se manteve relativamente larga em comparação com o ano passado.
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Em julho o volume mensal das exportações caiu dramaticamente. O total embarcado foi de apenas 7,7 milhões de sacas, 22% menos que em julho do ano passado, e o menor volume mensal desde outubro de 2011. Vários grandes produtores exportaram menos, mas por razões ligeiramente diferentes.

O Brasil exportou 33,1% menos que no ano passado, embarcando 1,9 milhão de sacas, das quais 1,6 milhão de Arábica verde (-26.3%), 300.000 sacas de torrado e solúvel (-10,3%) e menos de 40.000 sacas de Robusta (-90,9%). Esse cenário reforça a ideia de que os estoques internos do país quase se exauriram, com a safra de 2016/17 para começar a chegar ao mercado em breve. No entanto, há alguma preocupação com a oferta de Robusta, a maior parte do qual usada para consumo interno, e assim é provável que certo volume de Arábica inferior seja necessário para suprir o mercado local,  potencialmente reduzindo a disponibilidade no próximo ano.

Estima-se que o Vietnã exportou 5,9% menos, embarcando 1,65 milhão de sacas. É importante frisar que as cifras aqui apresentadas são provisórias, diferindo bastante das cifras oficiais das alfândegas. Acredita-se que a diferença seja explicada pelo café liberado pelas
alfândegas mas ainda não embarcado, sugerindo considerável acúmulo de estoques no país. Isso poderia ajudar a aliviar problemas da oferta o ano que vem.
Na Colômbia, as exportações caíram quase 60% para apenas 489.000 sacas, pois uma greve dos caminhoneiros impediu a movimentação interna do café. Com o término da greve, o fluxo das exportações deve ter sido retomado em agosto, mas prevê-se que uma falta de chuvas atribuível ao El Niño resultará em menor produção mais para o final do ano.
Por último, a Indonésia vem constantemente registrando menores volumes de exportação desde o início de seu ano-safra em abril, pois a safra de 2016/17 também parece seriamente afetada pelo El Niño. O total das exportações do país no primeiro terço do ano-safra (abril a julho) caiu mais de 45%, limitando-se a 1,5 milhão de sacas.
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Disso tudo resultou que o total exportado nos primeiros 10 meses do ano cafeeiro foi de 93,3 milhões de sacas, 1,7% menos que no ano passado. Os embarques dos Arábicas aumentaram 2,6%, graças à exportação de maiores volumes de Outros Suaves e de Naturais
Brasileiros. Os embarques dos Robustas, por sua vez, diminuíram 8,2%.
[Fonte: www.oic.org]