Café Forte, desconstruindo um mito!

[Por: Ronaldo Muinhos, Diretor e especialista em café do Buenavista Café]

Com tradição secular no café, o brasileiro habituou-se a consumir o chamado café “Forte” ou, no pior dos casos, “Extra Forte”. Mas, o que seria um café forte? A palavra forte, neste caso, indica intensidade e, em se tratando de café, tem sua origem principal no processo de torra. Então, vamos entender como acontece a torra de café e suas fases, para tentarmos desconstruir o mito de que café bom é café forte.

Fases do processo de torra
Fases do processo de torra

 

  • Amarelamento: Nos primeiros minutos de torra, o grão permanece esverdeado e vai se tornando amarelado com a perda de água por evaporação. É liberado um sutil aroma de grama molhada.
  • Vapor: Os grãos continuam a liberar água na forma de vapor e perdem umidade rapidamente o que, no grão verde, chega a 11%.
  • Primeiro Crack: O vapor se torna perfumado e logo começa a ser ouvidos barulhos semelhantes a pipocas estourando. É o primeiro crack. Aqui de fato o processo de torra começa, com o início da caramelização dos açúcares e movimentação dos óleos presentes no grão.
  • Primeiro ponto de torra: Logo após o primeiro crack, temos o primeiro ponto de torra que podemos considerar como completo, ponto denominado City Roast.
  • Caramelização: A caramelização continua e os óleos começam a migras para as partes mais externas. O grão se expande tornando-se escuro. Este ponto é chamado de City + Roast. É um ponto de torra considerado limite para cafés de qualidade. Quando se aproxima o segundo crack, temos o ponto Full City Roast.
  • Segundo Crack: Neste ponto, uma série de estalos podem ser ouvidos novamente, embora mais sutis. Os óleos então se aproximam da superfície do grão. Os sabores começam a sofrer interferência indesejada da carbonização dos açúcares. Este é o ponto Viena Roast.
  • Início da carbonização: A cor se torna muito escura e um cheiro de fumaça se forma com a queima completa dos açúcares. Os óleos começam a romper a barreira externa dos grãos. Com o fim do segundo crack, chegamos no ponto de torra Frech Roast.
  • Carbonização completa: Os açúcares se carbonizam por completo, óleos brotam na superfície do grão, resultando em uma bebida sem corpo e com gosto de “água de carvão”.

Curva de atributos x intensidade da torra

Não se sabe ao certo como essa tradição por cafés com torras extremas começou, mas tudo indica que foi pela baixa qualidade dos grãos consumidos. Ainda hoje é usual na grande indústria de torrefação o uso de torras extremas, na maioria das vezes um recurso para garantir a homogeneidade e padrão do produto, como também mascarar os defeitos de um café de baixa qualidade e, em alguns casos, ocultar outros cereais ilegais.

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Para cafés de alta qualidade, o ponto de torra ideal fica próximo ao Primeiro Crack, nunca antes, nem tampouco, após o Segundo Crack. Não existe uma curva de torra ideal, cada grão, de cada safra, se comportará de formas diferentes, em pontos de torra diferentes. Basta uma pequena diferença de 1oC, por exemplo, para mudarmos as características sensoriais na xícara.

Alguns preferem o pão mais clarinho, outros mais moreninhos, mas ninguém pede ao padeiro um pão carbonizado. Por que então consumimos cafés assim?

Café de baixa qualidade x café de alta qualidade

Torra Ideal

Na torra ideal, podemos identificar claramente a qualidade do grão utilizado, sentir seus aromas e sabores, seu corpo, a acidez e sua doçura natural. Já naqueles com torra extrema, isso não é possível. Ou seja, utilizando um bom café, sem defeitos, ou um café de baixa qualidade e com muitas impurezas, o sabor será o mesmo, o de carbonização.

Em pesquisa recente do Procon de Minas Gerais, 30% do café comercializado no estado foi considerado impróprio para consumo por conter impurezas, sedimentos, além de larvas e parasitas. Podemos afirmar, com grande margem de segurança, que possivelmente 100% destes cafés possuem torras extremas, claramente para esconder tantas impurezas.

Optar por cafés com torra clara ou média é questão de saúde! 

O café é uma bebida altamente complexa, rica em sabores e aromas, naturalmente doce, com leve acidez que o torna uma bebida rica. Ao escolhermos um café “Forte” ou “Extra Forte” perdemos todos os atributos de qualidade de um café, além de corrermos riscos para nossa saúde. E então, é isso que você deseja?

14 comentários em “Café Forte, desconstruindo um mito!”

  1. Quem toma café sem açúcar como eu, não consegui segue tomar o café carbonizado, quer dizer, tradicional. Faltam campanhas para ensinar o povo em geral a conhecer o bom café, que não precisa ser um café especial.

    1. Com certeza, o consumidor precisa ter conhecimento do que compra, pois é a sua saúde que está em jogo!

  2. Pesso gentileza de dar-me mais informações sobre o uso de uma boa bebida como é o caso do café Obrigado.

    1. Muito obrigado! Contamos com vocês para que essas informações cheguem ao maior número possível de consumidores!

      1. Francisco Barbosa. A bastante tempo venho consumindo o café extrato forte entendendo eu ser o melhor café . Quero saber mais pois sou consumidor de um bom produto obrigado.

    1. Sim Celso! Nós do Buenavista Café utilizamos a torra por perfil acompanhado por um sistema informatizado que nos garante muita precisão nas torras!

        1. Olá Thatiane! Não temos uma resposta objetiva pra essa pergunta já que o ponto de torra, isoladamente, não define a qualidade de um café. Podem existir cafés com torras claras, mas com baixa qualidade. O ideal é procurar cafés da “Terceira Onda” (Entenda este conceito aqui), como os do Buenavista Café! São produzidos em pequenas escalas com foco na qualidade e torrados com extremo cuidado, ao contrário do café comercial, produzido para o consumo de massa, este que é normalmente encontrado nos supermercados. Abraços!

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