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Dicas para um café perfeito – O Segredo dos Profissionais

Por Ronaldo Muinhos, Diretor e especialista em café do Buenavista Café.

Aprendemos desde cedo, seja na casa dos nossos pais ou avós, a preparar café, seguindo os métodos, receitas e proporções, conforme a tradição da família.  Entretanto, ao contrário da época de nossos pais e avós, hoje temos acesso à cafés de maior qualidade, são cafés da Terceira Onda, torrados artesanalmente, de origem específica e de sabores e aromas altamente ricos e complexos. Os cafés mudaram, se tornaram mais delicados, com torras mais claras, o que exige que se adote certos cuidados para que se obtenha uma boa extração, que potencialize seus atributos e evite os erros mais comuns quando se evolui de um café comercial, torrado ao extremo, para um café especial de alta qualidade.

Assim como o café, os métodos também evoluíram.
Assim como o café, os métodos também evoluíram.

Selecionamos algumas dicas essenciais, utilizadas pelos profissionais baristas para que você possa ter uma experiência sem frustrações.

A Escolha do Café

A melhor dica é preferir as micro torrefações artesanais da “Terceira Onda do Café” às grandes marcas. Em geral, as micro torrefações focam totalmente em cafés de alta qualidade, prospectando e trazendo os melhores cafés especiais a cada nova safra. O processo de torra é mais controlado, utilizando um perfil de torra ideal para cada grão, feito em pequenas quantidades.

  • Cafés Arábica possuem maior potencial para a alta qualidade. Procure pela informação “100% Arábica” na embalagem.
  • O termo “Café Especial” indica um café acima de 80 pontos na escala da Specialty Coffee Association, considerado os melhores do mundo.
  • Compre cafés com a torra mais recente possível. Depois de torrado, o café perde aromas e sabores muito rapidamente.
  • Torras escuras podem mascarar defeitos do grão. Para os cafés Especiais, em geral, se utiliza torras médias à claras para valorizar os aromas e sabores.
  • Prefira o café em grãos e moa somente a quantidade que for utilizar no seu preparo.
  • Prefira embalagens que possuam a válvula aromática. Esta válvula é importante na manutenção da qualidade por mais tempo.

Métodos de Preparo

5_Dicas_para_um_Café_Perfeito

Vivemos hoje uma nova revolução na forma de prepar café. Os japoneses tem investido, com muita criatividade, no desenvolvimento de novos métodos e vem tornando o ritual de tomar café parecido com o milenar ritual do chá. Os métodos abaixo possibilitam os melhores resultados:

Chemex

Utiliza um elegante recipiente de vidro com funil incorporado onde se apoia o filtro de papel que é mais fino que o normal. Utiliza moagem média a fina.

Hario V60

Desenvolvido pela japonesa Hario, este porta filtro possui angulação de 60°, estrias em espiral e um grande orifício para um melhor fluxo do café. Utiliza moagem média a fina.

Kalita

Similar ao Hario V60, possui a base plana para permitir uma infusão mais uniforme do café. O maior diferencial é o filtro de papel  com 20 ondulações que ajudam a isolar a infusão da parede do coador e evitar perda de calor, aumentar a área de coagem e melhorar o fluxo. Moagem média a fina.

Sifão

A ideia do sifão é utilizar duas câmaras onde pressão de vapor e vácuo produzem café. É um método trabalhoso, mas que produz um café limpo. Use moagem média.

FrenchPress (Prensa Francesa)

Utiliza um pistão com uma malha de aço inox que, pressionando a mistura de pó e água, extrai o café preservando seus óleos. Requer uma moagem mais grossa.

Aeropress

Inventado por um americano, o Aeropress é um método rápido e prático. Um êmbolo pressiona água e o pó por um filtro de papel. É o preferido dos profissionais juntamente com o Hario. Moagem média a grossa.

Moka (Cafeteira Italiana)

Por ser acessível, prática e por produzir ótimos resultados é a queridinha de muitos. Utiliza uma câmara com água, que ao ferver, atravessa o pó e efetua sua extração em outra câmara superior. Use moagem média.

Proporções e Medidas

Você pode partir de uma medida padrão, mas pode e deve fazer experiências e encontrar a proporção que mais agrade para cada tipo de café escolhido. Dica: uma balança de precisão é utensílio imprescindível.

Proporção 1/16

Utiliza uma parte de café para 16 partes de água.

Exemplos:
1 Xícara (200ml): Utilizar 12,5g de café.
2 Xícaras (400ml): Utilizar 25g de café.

Proporção 1/14

Utiliza uma parte de café para 14 partes de água.

Exemplos:
1 Xícara (200ml): Utilizar 14,3g de café.
2 Xícaras (400ml): Utilizar 28,6g de café.

A Água é Importante

A água corresponde à 99% do café e tem grande influência no resultado final. Evite utilizar água da torneira, pois impurezas contidas nela irão passar para o café. Prefira água filtrada ou mineral e nunca ferva. A temperatura ideal é de 93°C, abaixo dessa temperatura os óleos essenciais presentes no café poderão não ser extraídos resultando em um café fraco e subextraído. Acima desta temperatura o resultado pode ser de forte amargor.

Saiba mais sobre água em: A água também interfere no café

O Segredo dos Profissionais

Blooming

Utilize uma pequena porção de água para umedecer o pó e aguarde de 20 a 30 segundos para continuar. Este processo ajuda na liberação de CO² e de compostos aromáticos.

Filtros de Papel

Os filtros de papel contém impurezas que interferem negativamente. Antes de colocar o pó, passe água quente por ele e a descarte.

Água

Adicione o restante da água de forma delicada fazendo movimentos circulares. Nunca mexa com colher.

Tempo

O tempo ideal de extração é de 3 a 4 minutos, mais que isto ocorrerá extração em excesso de cafeína, causando amargor indesejado.

Aplicativos para Café

Baristame

baristame, disponível no Google Play
Baristame, disponível no Google Play

Existem muitos aplicativos disponíveis para Smartphones e Tablets sobre café, mas são poucos os que merecem destaque. O nosso preferido é o Baristame, App muito bem feito e com bom nível de maturidade. Ele reúne informações sobre origens do café, moagens, água e métodos, além de um guia passo-a-passo na hora do preparo com controle de proporções e timers para marcar o tempo de cada fase do método. É necessário uma balança de precisão para uma experiência completa. O Baristame possui uma boa versão Free e outra paga. Não há versão para iOS, entretanto, encontramos um similar, é o Coffee Time!

Acaia Coffee

O Acaia Coffee é um App que se comunica, via Bluethoot, com as balanças de precisão Acaia. Nele é possível acompanhar cada detalhe da extração através de gráficos em tempo real. É o Gadget do momento, e sonho de consumo de muitos apaixonados por café como nós. Custa cerca de R$ 650,00 mas infelizmente não está disponível no Brasil.

Disponibilizamos uma versão destas dicas em um Poster de alta resolução em PDF. Você pode seguir as dicas e compartilhar com os amigos. Baixe aqui e bons cafés!

A Ciência da Torra

Por Ronaldo Muinhos, Diretor e especialista em café do Buenavista Café.

A torra é responsável por mudanças físico-químicas que permite tornar o grão de café verde palatável para nós, além de desenvolver seus sabores e aromas característicos.

A torra do Buenavista Café é reconhecida por clientes, parceiros e publicações do setor por sua alta qualidade e precisão. Mas quais são os processos envolvidos nesta fase, que é considerada uma das mais importantes na cadeia cafeeira?

Processos da Torra

A torra do café verde normalmente ocorre em temperaturas acima de 200°C onde são desenvolvidos os sabores e aromas, além de alterações estruturais no grão.

As alterações físico-químicos que ocorrem  durante o processo de torra são complexos, envolvendo muitas interações entre compostos.

Principais eventos durante no grão de café durante a torra.

Durante a torra, calor proveniente do ar ou superfícies quentes do torrador é transferido para os grãos. O aumento interno da temperatura provoca a evaporação da umidade dos grãos em um processo Endotérmico. Com o aumento da temperatura, reações exotérmicas têm início, concomitantemente com a formação de compostos voláteis e CO2. Com o aumento da pressão interna, ocorre a expansão dos grãos, causando pequenas rachaduras em suas paredes, evento conhecido como crack. Quando se atinge o grau de torra desejado, os grãos são despejados em uma bandeja de resfriamento para interromper a torra. O resfriamento não deve ultrapassar os cinco minutos.

Mudanças Físico-Químicas

A torra de café é um processo altamente complexo, envolvendo um grande número de reações químicas e muitas reações físicas. Elas ocorrem entre 10 a 15 minutos para temperaturas acima de  200°C.

Nas últimas décadas, muitos pesquisadores investigaram as mudanças do café durante o processo de torra, mas não foram capazes de determinar por completo este processo.

Mudanças Químicas

O principal carboidrato presente no grão verde é a sacarose. Em geral, grãos Arábica possuem duas vezes mais sacarose que grãos Robusta ou Conilon. Durante a torra, a sacarose é rapidamente degradada, permanecendo uma pequena quantidade no grão torrado. Esta pequena quantidade de sacarose sofre um processo de pirólise e caramelização. Uma pequena fração desta sacarose residual é hidrolisada em glicose e frutose, que terão papel importante na reação de Maillard, responsável, principalmente, por conferir cor e sabor ao café.

Outros compostos químicos importantes que sofrem alterações são os ácidos clorogênicos, lipídios e compostos contendo nitrogênio.

Reação de Maillard

A reação de Maillard tem muita importância para a qualidade final do café.  É através dela que o grão adquire sua cor marrom e seus aromas característicos. Esta reação foi primeiramente descrita pelo químico francês Louis-Camille Maillard em 1912.

Nesta reação ocorre a degradação de carboidratos e aminoácidos, que formam compostos de coloração escura chamados maloidinas. Ocorre também a formação de compostos voláteis responsáveis pelo aroma.

Pirólise

É a decomposição de materiais pela ação de altas temperaturas. Neste processo, ocorre a ruptura da estrutura molecular original do grão pela ação do calor em um ambiente com pouco ou nenhum oxigênio.

Mudanças Físicas
Espectro de torra.
Espectro de torra.

A cor dos grãos mudam progressivamente, passando do verde ao marrom escuro. A cor final dependerá do ponto de torra desejado. Com a desidratação e pirólise, há uma perda de massa entre 14% a 20%, o que pode variar com o grão utilizado e também o ponto de torra, sendo que em torras mais escuras, teremos maior perda. Uma torra de 1Kg de café verde pode produzir cerca de 850g de café torrado, por exemplo (15% de perda).

Outra mudança significativa é o aumento do tamanho dos grãos devido a formação de CO2, vapor e compostos voláteis. Os grãos podem aumentar seu volume em até 40%, com isso sua densidade diminui proporcionalmente. Ocorre também a formação de porosidades (citoplasmas), onde se alojam muitos compostos responsáveis pelo sabor como lípidos, proteínas, carboidratos, cafeína, ácidos clorogênicos e minerais.

Diferença de porosidades no café verde e torrado
Diferença de porosidades no café verde e torrado.

Torradores

Os equipamentos de torra são desenvolvidos para permitir que ar quente e grãos entrem em contato entre si para que o processo de torra ocorra. Existem vários tipos de torradores mas, em geral, apresentam seis componentes básicos:

  1. Tambor de Torra, onde os grãos são torrados;
  2. Misturadores presentes no tambor para homogenizar as trocas de calor;
  3. Controle de Temperatura;
  4. Controle de Fluxo de Ar;
  5. Bandeja de Resfriamento;
  6. Coletor de Películas.
Componentes básicos de um torrador de café.
Transferências de Calor

Os torradores atuais, em geral, contém os três tipos de transferência de calor atuando em conjunto em diferentes graus, dependendo da característica do equipamento. A transferência por convecção é a predominante nas tecnologias atuais.

Transferência por Condução

Ocorre através do contato físico do grão com a parede aquecida do tambor de torra. A utilização do aço-carbono oferecem uma temperatura uniforme em toda a superfície do tambor.

Transferência por Radiação

Ocorre por meio de ondas eletromagnéticas, é uma fonte secundária de calor.

Transferência por Convecção

Este tipo de transferência ocorre através do aquecimento do ar na parte inferior do tambor, este ar aquecido sobe e o ar mais frio de cima desce, ocorrendo um processo circular.  Geralmente os tambores de torra são perfurados para aumentar este tipo de transferência, considerado a mais eficiente.

Controle do Grau de Torra
Controle por Cor ou Visual

Para controlar o ponto de torra desejado são utilizados duas principais técnicas. A primeira, e mais comum, é o controle pela cor, ou controle visual. Nela, o Mestre Torrador acompanha a evolução na cor dos grãos por um coletor de amostras. Quando o café atinge a coloração pretendida, é interrompido o processo e o café é então resfriado. Pode ser utilizado tabelas de cores de referência, como as tabelas Agtron.

Neste tipo de controle podem ocorrer variações no ponto de torra, decorrente de algumas interferências na detecção da cor do grão pelo olho humano. Essas interferências podem ser na luminosidade do ambiente, claridade do dia, e a diferença de visão entre pessoas. Até o simples hábito de verificar o celular durante o processo pode interferir negativamente na identificação da cor, por conta da interferência na visão pela luminosidade do aparelho.

Torra, ciência ou arte? #terceiraondadocafe #thirdwavecoffee #cafeespecial #café

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Controle por Perfil

A torra por Perfil é uma técnica mais moderna e precisa e que proporciona maior reprodutibilidade de um mesmo ponto de torra.

Perfil de torra  é o gráfico que descreve a temperatura em relação ao tempo de torra. Geralmente o controle é feito por sistemas informatizados, onde é possível acompanhar minuto a minuto se a temperatura da torra está seguindo o perfil determinado para aquele café.

Perfil de torra no sistema desenvolvido pelo Buenavista Café.
Perfil de torra no sistema desenvolvido pelo Buenavista Café.

Para cada café é desenvolvido um perfil de torra que potencialize suas qualidades e minimize seus atributos indesejados, como uma acidez agressiva por exemplo. Os passos para se desenvolver um perfil de torra são descritos abaixo:

  1. Determinar o ponto de torra ideal, ou temperatura final, através da experimentação, partindo de um perfil padrão;
  2. Determinar o tempo de torra ideal para atingir a temperatura final;
  3. Desenvolver o perfil para a temperatura final e tempo através dos ajustes na intensidade da chama e fluxo de ar.
Exemplo de uma torra em andamento no Sistema Buenavista Café. A linha vermelha é o perfil almejado e a azul a torra atual. Percebe-se que a temperatura atual apresenta-se maior que a do perfil.
Exemplo de uma torra em andamento no Sistema Buenavista Café. A linha vermelha é o perfil almejado e a azul a torra atual. Percebe-se que a temperatura atual apresenta-se maior que a do perfil.

Para quem deseja se aprofundar no assunto, e se tornar um Mestre de Torra, o Buenavista Café oferece o Curso Básico de Torra por Perfil. Além de toda a base teórica, o aluno tem a oportunidade de torrar amostras de café aplicando os conhecimentos.

Interessados em adquirir cópia de nosso Sistema de Torra por Perfil podem fazer o pedido na nossa Loja On-line!

Software Coffee Roast

Boas Torras!

A água também interfere no café (Parte 2)

No post A Água Também Interfere no Café, vimos como é importante levar esse ingrediente em conta na hora do preparo da bebida.

Mas como escolher a água?

As recomendações da SCAA parecem complicadas e muito técnicas para o usuário de café.
Nesse segundo post sobre o tema, vamos esclarecer os requisitos para facilitar a compra no supermercado.

Selecionar as características ideais da água é essencial para um bom resultado na xícara
Selecionar as características ideais da água é essencial para um bom resultado na xícara
Odor e coloração

Esses são fáceis, não é mesmo? A água não pode estar turva, nem com cheiro ruim. Isso indicaria substâncias indesejáveis em suspensão no líquido.

Cloro

Mais presente na água da torneira, adicionado pela concessionária; pode ser removido, total ou parcialmente, por muitos filtros disponíveis no mercado. No caso de água mineral, não costuma ser um elemento presente.

Sólidos dissolvidos totais

Muitas vezes, vem apresentado no rótulo como “resíduo de evaporação”. A SCAA recomenda algo em torno de 150 mg/l. De modo geral, valores muito baixos, inferiores a 100 mg/l, deixam a água leve demais ou neutra, enquanto que valores muito altos, acima de 250 mg/l, deixam a água muito dura.

Água mole, água dura? Mas o que é isso?

Dureza da água é a propriedade relacionada com a concentração de íons de determinados minerais dissolvidos nesta substância. É predominantemente causada pela presença de sais de Cálcio e Magnésio.
É medida geralmente com base na quantidade de Partes por milhão de Carbonato de Cálcio CaCO3, também representada como mg/l de Cálcio CaCO3. Quanto maior a quantidade de “ppm”, mais “dura” será considerada a água.
Embora não haja uma convenção formal, a título de praticidade, a água pode ser classificada quanto a dureza de acordo com as medidas seguintes:

Muito mole:      0 a 70 ppm
Mole (branda): 70 a 135 ppm
Média dureza: 135 a 200 ppm
Dura:         200 a 350 ppm
Muito dura:   Mais de 350 ppm

As águas europeias têm a fama de serem muito duras, enquanto as brasileiras, mais moles.
Inclusive, não se recomenda usar água muito dura em máquinas de espresso, pois pode haver o fenômeno da calcificação dos componentes. Os sólidos presentes na água se depositam nas peças da máquina, que passa a exigir limpeza mais frequente para retirá-los.

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A photo posted by Hario Tokyo (@hario_japan) on

Alcalinidade

Devida principalmente aos carbonatos e bicarbonato e, secundariamente, por outros íons. A alcalinidade é a soma da alcalinidade produzida por todos esses íons. Impacta diretamente no pH.

pH

Soluções com pH menor que 7 são ácidas, e com pH maior que 7, básicas ou alcalinas. A água pura é neutra (pH = 7), sendo assim não é considerada ácida nem básica. A SCAA recomenda valores entre 6.5 e 7.5, justamente para que o pH da água seja o mais neutro possível e não interfira muito no pH esperado do café preparado com aquele grão.

Sódio

Próximo de 10 mg/l é o recomendado. O sódio elevado pode deixar um gosto “salgado” no café, e interferir na percepção de sabor.

Além das recomendações da SCAA, há outros elementos na água que interferem no sabor final da bebida:

Bicarbonato

Ideal que esteja entre 30 e 50 mg/l. O Bicarbonato neutraliza os ácidos ruins, mas não só estes. Por esse motivo, havendo bicarbonato em excesso, o café ficará “flat”, sem brilho. Um conceito oficial de “brilho” na SCAA é referente especificamente à acidez: quando mencionam que o café está brilhando é porque principalmente a acidez está complexa, distintiva, com notas diferentes e claras presentes.
No entanto, o Bicarbonato pode salvar alguns cafés naturalmente muito ácidos (mas vai matar cafés com acidez média ou baixa). Importante é escolher qual o tipo de água que funciona melhor com cada tipo de café.

Magnésio

Entre 30 e 50 mg/l, é um grande favorecedor de aromas e sabores.

Cálcio

Sua presença define o outro fator de dureza da água (principalmente quando combinado com o magnésio, este em doses altas), e águas duras são problemáticas para extração de solúveis indesejáveis, mas há quem as prefira em certos países. Os parâmetros ideais são em torno de 10 a 20 mg/l.

Experimentos sobre efeitos da qualidade da água no café (Five Senses Coffee)
Experimentos sobre efeitos da qualidade da água no café (Five Senses Coffee)

As informações apresentadas servem apenas como referência, pois há muitas outras variáveis envolvidas no preparo do café: método de preparo, tempo de infusão, tempo de torra, grau de moagem, o grão em si… Grãos diferentes podem se comportar de maneira completamente distinta com a mesma água – e vice-versa! Por isso, o ideal é fazer vários testes e encontrar a sua receita preferida de preparo.

Leia Também: A Água também Interfere no Café (Parte 1).

[Por: Simone Lazzarini, Coffee Lover e cliente Buenavista Café]
Fontes:

1. Preparação de água – guias e testes
http://forum.clubedocafe.net/index.php?/topic/4521-prepara%C3%A7%C3%A3o-de-%C3%A1gua-guias-e-testes/

2. Águas minerais de algumas fontes naturais brasileiras
http://www.scielo.br/pdf/ramb/v45n3/1658.pdf

3. “A delicada questão da água”
http://www.thecoffeetraveler.net/new-blog-5/2015/8/24/a-delicada-questo-da-gua

4. “O jogo da água”
http://www.thecoffeetraveler.net/new-blog-5/2015/8/24/o-jogo-da-gua

5. Water For Coffee – A Sensory Viewpoint with Maxwell Colonna-Dashwood (em inglês)
http://europeancoffeetrip.com/water-for-coffee-maxwell-colonna-dashwood/

6. Dureza da água
https://pt.wikipedia.org/wiki/Dureza_da_água

A Terceira Onda do Café

Acompanhamos, despercebidamente, um movimento crescente no mercado de cafés no país. O surgimento de marcas de cafés, micro torrefações e cafeterias que investem em alta qualidade, não só do insumo, mas também na forma de preparo e filosofia de negócio, principalmente encabeçado por pequenas marcas locais e independentes. É a chamada “Terceira Onda do Café” ou “Third Wave Coffee“.

O termo surgiu em meados do ano 2000, mas teve sua popularização nos últimos anos. É um movimento forte nos Estados Unidos e Europa e que aos poucos ganha força por aqui.

Cafés Especiais x Commodity

Arábica da variedade Acaiá da Fazenda Santa Quitéria, parceira do Buenavista Café.
Arábica da variedade Acaiá da Fazenda Santa Quitéria, parceira do Buenavista Café.

Alinhada à exigência crescente dos consumidores por qualidade, o movimento valoriza o café como um produto artesanal em vez de uma mercadoria ou commodity. A busca pela qualidade envolve todas as fases de produção, desde o cultivo, passando pela colheita, processamento, torras frescas e principalmente, uma forte relação com os produtores, através de um comércio justo e sem pressões por preços baixos, prática comum da grande indústria.

Classificação do café.
Classificação do café.

A popularidade da Terceira Onda ganha força com a crescente procura por grãos de alta qualidade, com destaque para os Especiais, cafés com pontuação acima de 80 pontos na metodologia da Associação Americana de Cafés Especiais (SCAA). São cafés isentos de defeitos, produzidos sob rigorosos controles de qualidade, além de exigências nas áreas social e ambiental, sempre homologadas por certificações internacionais, como a UTZ, Rain Forest, CertificaMinas e Direct Trade.

As Três Ondas

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A Primeira Onda

Atribui-se à Primeira Onda do Café o aumento significativo e proliferação do consumo da bebida em todo o mundo, a partir do final do século XIX e início do século XX. Inicialmente, o consumo de café tinha característica essencialmente utilitária, visando ao estímulo de energia e melhoria de concentração e desempenho decorrentes da ingestão de cafeína. Caracterizava-se pela baixa qualidade dos cafés, essencialmente compostos por grãos conilon (robusta). Com torras de muito escuras, apresentavam sabor amargo e com pouco “corpo” na bebida.

Leia: Café Forte, desconstruindo um mito!
A Segunda Onda

Nesta onda, popularizou-se os conceito de cafés especiais e as diferenciações de origem, ou seja, o reconhecimento de que um café do Brasil é diferente de um da Colômbia, ambos diferentes do café da Guatemala e assim em diante. Também, descobriu-se que variações no processo de torra levariam a bebidas com perfis sensoriais variados e distintos daquele padrão da Primeira Onda.

O café passou, então, a ser apreciado, mesmo não perdendo completamente sua característica de consumo utilitário.

A Segunda Onda foi responsável pela popularização do espresso e sua apresentação para o mundo. Nesta onda, aumentou, consideravelmente, a variedade disponível de bebidas à base de café e de perfis de sabor desta bebida, permitindo a apreciação, também, por um público mais jovem.

A Terceira Onda

O movimento começou como uma reação à massificação e padronização dos cafés na Segunda Onda, torrados quase sempre em excesso, e preparados de modo a alcançar sempre os mesmos perfis de sabor, de forma a manter a consistência de produto, atendendo às expectativas daquele público consumidor.

O distanciamento destas e outras práticas, associadas à Segunda Onda, levou à utilização exclusiva de cafés especiais, com uso quase exclusivo de grãos da espécie arábica, e a uma grande atenção às suas notas aromáticas de sabor, altamente influenciadas pela origem de produção (terroir), métodos de produção e processamento, bem como condições climáticas e outros fatores. Nessa ótica, o café passa a ser encarado como produto complexo e sazonal, passando por um processo de completa “descommoditização”.

Outras formas de diferenciação e agregação de valor ao produto incluem seu preparo artesanal, manualmente, sem pressa, em frente ao cliente e em doses únicas (sob demanda), bem como a utilização de latte art. Desta forma, a bebida torna-se exclusiva e singular, motivo pelo qual é incentivado seu consumo sem aditivos, como açúcar ou chocolate, que mascaram suas notas aromáticas e de sabor, tão desejadas e trabalhadas ao longo de toda a cadeia.

Repost from @blackupcoffee

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A visão “Seed to Cup” da Terceira Onda influenciou, também, a busca por torras e métodos de preparo que ressaltassem as características únicas de aroma e sabor obtidas, por meio dos diversos métodos de produção e processamento, trabalhados conjuntamente pelos elos da cadeia desde o início do processo.

Na Terceira Onda, o espresso ainda tem seu espaço, mas é preparado de forma mais manual e menos automática, e cede espaço para os métodos de preparo de café filtrado, os grandes protagonistas desta onda. Dentre estes métodos, que permitem uma maior extração de sabor e destaque das nuances únicas dos cafés, destacam-se o V60, Chemex, Kalita, AeroPress, French Press, Siphon e Cold Brew. Justamente por permitir maior destaque das características distintivas de cada grão, há grande preferência pela utilização de grãos de origem única, ou seja, apenas uma variedade e sem misturas, ou blends.

Many V60s at the photo taken by @morifuji_coffee #hario #v60

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As mudanças não param

Impulsionado pelo desejo de novas experiências, nossa criatividade nos levam à cenários inimagináveis. Não sabemos o que ainda está por vir no mercado de cafés, nem como será a “Quarta Onda”, mas percebemos pequenos movimentos relacionados à tecnologia.

Hoje já podemos encontrar Gadgets controlados por smartphones, que medem todos os parâmetros de uma extração, tempo, quantidades de água, café e proporções. Em breve poderemos ter a inclusão de medidores de sólidos solúveis na bebida além de outras inovações.

Muitos aplicativos para smartphones e tablets auxiliam o consumidor final para o preparo de café em diferentes métodos, utilizando técnicas e protocolos antes restritos aos baristas. O conhecimento está saindo das mãos dos profissionais e chegando até a última ponta da cadeia através da tecnologia.

Internet das Coisas (Internet of Things – IoT)

A Internet das Coisas é uma revolução tecnológica destinada à conectar dispositivos eletro-eletrônicos utilizados no dia-a-dia. Pode ser uma geladeira, seu carro ou porque não, sua máquina de café espresso? A convergência da tecnologia IoT com as máquinas de café espresso por exemplo, já são uma realidade.

Enquanto a próxima onda não vem, podemos apreciar as incríveis experiências da onda atual, repleta de descobertas e sabores incríveis!

[Por: Ronaldo Muinhos, Diretor e especialista em café do Buenavista Café]

Fontes:

  1. Terceira Onda do Café: Base Conceitual e Aplicações (Elisa Reis Guimarães, UFLA, 2016);
  2. Relatório Internacional de Tendências do Café (VOL. 5 / Nº 10 / 30 de novembro de 2016).

Cappuccino, estamos fazendo isso errado!

Existe uma grande diferença entre o que o brasileiro entende ser um cappuccino e o que a tradição desta bebida de fato corresponde.

Analisando os ingredientes entre as duas versões, é possível constatar que há algo de estranho na nossa versão:

Ingredientes do Cappuccino brasileiro:

Açúcar, leite em pó integral, café solúvel, leite em pó desnatado, estabilizante bicarbonato de sódio, cacau em pó, espessante carboximetilcelulose, antiumectante fosfato tricálcico e canela em pó.

Ingredientes da receita original:

1/3 de café espresso, 1/3 de leite e 1/3 de espuma de leite;

Cappuccino em sua receita original
Cappuccino em sua receita original

A palavra Cappuccino tem origem no termo em latim Caputium, é o diminutivo de cappuccio, em italiano, que significa pequeno capuz. Segundo as histórias, o nome da bebida se relaciona à cor marrom dos hábitos dos monges da ordem capuchin, inspirados nas vestimentas preservadas de São Francisco de Assis, que datam do século XIII.

Túnica de São Francisco de Assis preservada na igreja St.Francis em Cortona, Itália (1155-1225).
Túnica de São Francisco de Assis preservada na igreja St.Francis em Cortona, Itália (1155-1225).

Tradição x Oportunismo

A nossa versão industrializada do cappuccino em nada lembra a simplicidade da receita original, na verdade, a indústria de alimentos se aproveitou, indevidamente, do seu nome de grande tradição para lançar seu “preparado à base de café solúvel”, sempre com muito açúcar.

As tradições existem para serem preservadas, mas também podem ser o ponto de partida para inovações. Não são regras, e podem ser adaptadas para que possamos ter novas experiências. Mas respeitar uma tradição é respeitar seus precursores,  e uma forma de agradecimento por seus momentos de criatividade que tornaram nossas vidas melhores.

Variações do cappucino podem levar canela e chocolate em pó, polvilhados sobre a receita tradicional. O Latte e o Macchiato são receitas similares, que levam também o espresso e o leite vaporizado.

Cappuccino em casa, como fazer?

A receita tradicional é feita em máquinas de espresso, onde é possível fazer o leite vaporizado, além do próprio espresso. Algumas máquinas de espresso para casa também possuem a função de vaporização de leite. Mas se não temos uma máquina dessas, ainda é possível preparar uma bebida muito próxima do cappuccino.

O mais importante é respeitar as proporções de 1/3 de café, 1/3 de leite e 1/3 de espuma. Para o café, podemos preparar um coado mais intenso, ou na moka (cafeterira italiana). Já com o leite, o processo é um pouco mais complicado, mas ainda assim possível fazer.

Existem no mercado cremeiras próprias para essa função, também é possível criar a espuma com um pequeno mixer. Se você já tiver em casa uma cafeteira francesa, ou Frenchpress, é possível utilizá-la como uma cremeira. Abaixo um vídeo com maneiras diferentes de criar espuma com o leite em casa. O leite integral oferece os melhores resultados por conter porcentagem maior de gordura.

Gosto é questão pessoal

Entendemos que gosto é muito pessoal. Temos como objetivo, apenas tentar desmistificar alguns conceitos que nos são informados de forma errônea. A cultura do café é milenar e precisa ser preservada.

Esperamos que  seu próximo cappuccino seja repleto de sabores e histórias!

[Por: Ronaldo Muinhos, Diretor e especialista em café do Buenavista Café]